CINCO CONTOS CINCO PONTOS: AMIZADES EM TEMPOS DE PANDEMIA (ANTOLOGIA)


GUINADAS QUE A VIDA DÁ

 LIVRO: AMIZADES EM TEMPOS DE PANDEMIA

AUTORES: DIVERSOS (COLETÂNEA)

PROJETO: APPARERE

EDITORA: PERSE

ANO: 2021 (1ª EDIÇÃO)

OS CINCO CONTOS

Tento mostrar nesta série CINCO CONTOS CINCO PONTOS o que podemos extrair de narrativas relativamente curtas quando procuramos os pontos de parada, de checagem, em que o enredo traz algo de relevante para que a história fique redonda, e nos entregue algo palatável aos olhos e ao raciocínio.

 


No 1º conto falamos de um personagem que precisa migrar rapidamente, é aquelas guinadas que a vida dá. Como a temática da coletânea é amizade e pandemia, a adaptação ao novo habitat torna-se mais enfadonho.

No 2º conto o autor já traz uma história entre jovens típicos da geração Z, preso em leituras e produções literárias, e desajustados em relação ao mundo. Há citações de obras e autores diversos para nos colocar ao lado dos devoradores de livros. Um final em suspense.

No 3º conto a ambientação se dá em uma cidade interiorana. A relação de uma amizade esfriada pela convivência mais próxima e pelo tempo vai distanciando as amigas de infância. A morte da mãe de uma das personagens revela a amargura e o desconforto. O refúgio para a outra foi a simpatia por um ator e sua dor ao saber que ele faleceu.

No 4º conto temos um título chamativo e confesso que isto me ganhou. Temos a ambientação em Santos. Ou se trata de um relato autobiográfico ou de uma ficção bem construída. Lembranças da infância e adolescência e o faro que todo humano desenvolve em sua profissão ou hobby é que norteiam a narrativa.

No 5º conto encontramos a mãe diante de uma pergunta cabulosa. A história serve de entrada para a trama que se realiza próximo às duas. A televisão como fuga, assim como no 3º conto, leva a um desfecho tenebroso. Conto curto e intenso.

 

A FORÇA DA AMIZADE SE REVELA NA CRISE

FLAVIA STEINER

 

PONTO I

O processo de migração de uma recém-casada não foi fácil para Karina.

O conto começa nos revelando uma situação que tem causado tanta dor a tanta gente, a questão da migração. Karina, a personagem no conto de Flávia Steiner migra para a Europa. Neste caso trata-se de uma recém-casada que está indo para um país com cultura diferente do seu.

 

PONTO II

Pessoas... eram vistas como ameaças à riqueza e a continuidade cultural local.

Este terceiro mundo agora chamado de países em desenvolvimento para desconsiderar os países socialistas como segundo mundo, somente será aceito no países desenvolvidos quando a economia destes estão forte o suficiente para que todos estejam nos melhores empregos e ninguém quer fazer o “trabalho sujo”. É a economia sendo o motor da história, mesmo sendo a história fictícia.

 

PONTO III

Mesmo sendo uma pessoa muito sensível, e até mesmo frágil, Pimpa foi a amiga...

Aparece neste ponto do conto a mão estendida mesmo no isolamento social. Graças à tecnologia, Pimpa pode motivar Karina a seguir em frente em um mundo hostil, e não era somente pela pandemia.

 

PONTO IV

A falta de cooperação e conexão com o cuidado mútuo em justiça e amor talvez seja o maior problema da humanidade.

Mesmo pondo no talvez, a autora afirma nas entrelinhas do enredo como a humanidade está fazia, não cuidado do outro, gerando injustiças e desamores. É a preparação para a moral da história aqui no conto.

 

PONTO V

Como o ferro afia o ferro, assim o amigo afia o rosto de seu amigo

A autora usa um provérbio bíblico para justificar e sustentar no seu enredo a amizade entre Karina e Pimpa. Por fim há a indagação que faz em forma de afirmativa: O problema é isolamento da pandemia ou o isolamento do coração?

 

FIAT LUX

HELDER D’ARAÚJO 

PONTO I

Aquele antissocial que há não pouco consagrava-se à misantropia, viu no início da pandemia ruir seu estranhamento ante os encantos de sua futura Lou.

O conto começa com uma virada de atitude do personagem Tony, e quando há distanciamento e relações em dificuldades, seja por não se verem tanto ou por agora se verem demais, se conhecerem demais, há no relato um romance se iniciando, indo na contra-mão do que acontecia em geral.

 

PONTO II

Enquanto Tony procurava na seção de livros judaicos a obra de Éliphas Lévi topou com aquela luz como a Shaul.

O fato é que o encontro se deu no crepúsculo da normalidade, na biblioteca que ainda estava aberta, e o rapaz embriagado de livro e filosofia encontra a poeta.

 

PONTO III

Dali em diante o único contato dos pombinhos dar-se ia por rede social.

Em tempos de pandemias e redes sociais, a narrativa de um caso de amor não pode deixar de lado os recursos da tecnologia. Por isso é tão necessário este ponto que une as duas coisas que se viveu no ano de 2021.

 

PONTO IV

Quando Lou silenciava pelo aplicativo um tremor esquisito sacudia o rapaz.

Percebemos aqui um exagero na paixão de Tony, da esquisitice da solidão passou para a esquisitice da possessão. O antissocial dá tons de ser um rapaz possessivo. O silêncio dela no aplicativo o incomodava.

 

PONTO V

... uma voz suave sussurrou num encanto doce: “post tenebras lux”... ele sussurrou baixinho: ”fiat lux”.

E magistralmente o contista deixa o final em aberto. Ela teria chegado e com seu jeito suave havia citado uma parte de um dos seus poemas? Ou era a loucura já mordendo o possessivo que já dava a perda como certa? Assim ficou sensacional o final do conto. Há três dias ela não dizia nada para ele. Não conversava com ele pelo aplicativo. Teria ela morrido de Covid-19?


UM ADEUS PARA DONA MARLENE
JENNY ROGERONI

 PONTO I

Minha mãe acabou de falecer de Covid.

A protagonista que narra o conto recebe está informação da amiga Tânia, filha de Marlene, que acabara de falecer. Quantas pessoas nestes dois anos de pandemia não tiveram, entre lágrimas, dar seu recado para alguém?

 

PONTO II

Passei a maior parte da noite numa espécie de limbo,...

Quantas pessoas não passaram a noite assim durante uma pandemia. O recado de Tânea, seco, desconcertou nossa protagonista que se revela moradora de uma cidade do interior, onde as pessoas acreditavam que a pandemia era uma invenção da mídia.


PONTO III

Mais tarde, na faculdade, Tânia e eu dividimos uma quitinete.

A partir do recado de Tânia, a protagonista vai lembrando a relação entre as duas alo longo do tempo, lembre, em uma cidade pequena. Certamente a faculdade era em algum lugar mais populoso. E dividir uma quitinete traz desgaste na relação. Sempre foi assim. Quantas amizades são desfeitas por terem que morar juntos em alguma circunstância.

 

PONTO IV

Você está bem? Não. Quer que eu vá aí? Não.

Um diálogo quase monossilábico entre as duas ex amigas. Sim. Ex, uma vez que a vida foi distanciando as duas amigas de infância. Uma tentava ser agradável, útil. Mas tinha perdido alguém querido, o ator Chadwick Boseman, o pantera negra. Teve que ficar em silêncio perante o marido enciumado da simpatia dela pelo ator. Tânea que podia compartilhar sua dor com alguém, estava resignada diante da vida, do divórcio, da traição do pai com dona Marlene, sua mãe.

 

PONTO V

... chorei menos por elas que pelo Chadwick Boseman, que eu nem conheci.

Aqui está a deterioração das relações humanas na pós-modernidade. A protagonista sente que sentiu mais a morte do ator que ela admirava que da amiga em luto e da sua mãe que faleceu de Covid. Isto em uma cidade do interior.

 

O VELHO LOBO DO MAR
MARCEL ENOK

 

PONTO I

Sempre tivemos uma relação bem próxima do mar.

A primeira frase do conto está em consonância com o título que achei lindo. Confesso que tinha um outro conto com uma história mais longa de amizade entre um idoso e um garoto. Mas fiquei com este, afinal, é a história de uma família de Santos. Este me fisgou pelo título.

 

PONTO II

Meu pai sempre identificava os ventos como personalidades, sendo o sul, o mais temido.

Mais uma justificativa. Como lobo conhece a natureza da floresta e sente o odor da presa pelo vento, o pescador experiente, ainda que por lazer, sente o perigo pela direção do vento. Um lobo que conhece sua floresta, o mar.

 

PONTO III

Hoje eu sou um fotografo ambiental...

Ou é uma biografia ou é um conto bem construindo que dar ares de realidade a todo momento. Veja que a profissão do lobinho segue tendo relação com a natureza.

 

PONTO IV

Os troféus apodrecem com a madeira sendo comida por cupim

Uma excelente criatividade para descrever o avanço do tempo que vai soterrando o simbolismo da convivência com nossos pais. E o próximo parágrafo segue uma galeria de ídolos que foram ou são corroídos pelos cupins do tempo, que chamamos de horas.

 

 

MINHA AMIGA TELEVISÃO

VALÉRIA GUERRA REITER

PONTO I

Posso matar você e meu pai quando crescer?

Parece um conto de psicopatia, mas assim está esta sociedade doente, que faz da violência um show televisivo. Lembra a história de Suzane Von Richthofen que recentemente foi relembrado na Amazon prime. O conto é um alerta no que esse sensacionalismo tem produzido na mente das nossas crianças.

 

PONTO II

Claro que não minha filha, você não pode matar ninguém.

Resposta sábia da mãe que pensou antes. Não é porque é os pais. Não se pode matar ninguém.

 

PONTO III

Mas eu vi na televisão uma moça que matou os pais, ficar livre.

É claro que isto acontece. Não leitura não deve no sentido de que há uma impunidade deliberada na sociedade. É preciso discutir mais os processos que a nossa justiça trava diante de gravidades. A justiça não pode fazer o que quer uma população. Mas o que ela faz tem que ser compreendido para não cair no punitivismo.

 

PONTO IV

Foi quando avistaram uma mulher com uma faca na mão.

O diálogo entre a mãe e a filha sobre um assunto tão terrível é a narrativa, curta, deste último conto, que me fez ter que fazer a escolha anterior na resenha de O Velho Lobo do Mar. Uma daquelas narrativas que podemos dizer.

 

PONTO V

Só continuar com minha linda amizade com minha linda televisão.

É a justificativa insana da assassina. Penso nela dizendo isto perante o delegado e depois lido e relido no tribunal, no dia do julgamento. Talvez a psicopata, ou esquizofrênica acredite que assim como a Suzane, ela também terá uma boa defesa e conquistará as pessoas na detenção. Vai vendo.

 

Obs: Série sujeita a ajuste nas próximas resenhas.

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