LIVRO: ATLAS ANATÔMICO PARA ALMAS PUÍDAS
EDITORA: PATUÁ
ANO: 2021
Cabeça Dinossauro (Titãs)
O belíssimo e intrigante livro de
José Ronaldo Siqueira é dividido em três partes e um apêndice. É como se o
autor de um Atlas Anatômico estivesse organizando didaticamente uma obra. No
caso do nosso escritor que se imerge em um fluxo de consciência o que encontra
e nos apresenta são questões profundas da alma humana, numa sequência do seu
Manual Não Injuntivo de Como Criar um Monstro.
Imagem do facebook da Editora Patuá |
Nesta primeira seção do livro, há três
contos: Mente, Faces e Ouvidos. O primeiro conto nos revela uma cabeça cheia de
grilos (interrogações) e uma relação conflituosa. O grande momento deste
encontro é quando há mudança de narrador, feita com tanta maestria, que
entendemos se tratar de outro personagem narrando pela situação exposta. O
doar-se para a família é uma questão crucial na narrativa.
Já em Faces a pergunta inquietante: “Você faz bem para alguém?”. Já em Ouvidos o personagem que acompanha a vida de sua companheira, deixando uma questão para nós, leitores. Ele ouvia a ida para o trabalho dela e os diálogos dela com as pessoas, incluindo seu amante. Teria ele uma audição poderosa ou colocado algum microfone para monitorá-la? O autor não revela, propositalmente.
TRONCO
“Queria ter aceitado
As pessoas como elas são
Cada um sabe a alegria
E a dor que traz no coração”
Epitáfio (Titãs)
Qualquer pessoa da medicina,
sobretudo, da forense, ou um mero professor de biologia, iria perguntar para o
autor: — Só o coração? E os pulmões, estômago? O diafragma tão esquecido?
O coração é o órgão principal da literatura? Pode ser até que seja. E José Ronaldo Siqueira explora o bater do coração em um diálogo dramático. A temática da família volta. E somente no final, quando o acidente é mencionado é que vemos o motivo do conflito entre o já não mais casal.
Na seção Tronco o ar condicionado
segue sendo um coadjuvante perturbador. E o destaque da narração é a construção
do conto ancorado apenas nos diálogos. Uma técnica apurada de narrar.
MEMBROS
“Violência doméstica, violência cotidiana
São gemidos de dor, todo mundo se engana”
Violência (Titãs)
Mãos, no meu entender, é o mais dramático conto. Ele revela a alma mais puída de todas as almas. O abuso sexual de uma criança. E a criança, enfrentando o segredo, mas dando sinais de que algo está errado com ela. A incompreensão da mãe é apenas mais uma violação. A mão é apenas uma extensão do corpo e da alma desalmada. Contaço.
Pernas é um conto de memórias. Os
personagens relembram as aventuras juvenis dos anos 80 e 90, ao que parece. Uma
perna no passado e outra no presente, assim é a vida. E todos nós caminhamos nos
firmando com a perna-presente enquanto arrastamos a perna-passado, às vezes já
gangrenada.
CASCOS
“Homem primata
Capitalismo selvagem”
Homem Primata (Titãs)
Em casco é o animal (mula), “ou
seria um zoomorfismo?”, a criatura que se prende ao seu ciclo de violência,
trabalho e busca de alimento “verdi” e água gela guela. O animal testemunha um
assassinato do seu dono (di riba), ou o animal que é dono do “dono”? Mais uma
vez o autor nos leva a uma reflexão socio-existencial. Com a morte do
dono o animal percebe que ficou ali, esquecido. Mas não se importa, havia muito “verdi”.
“O pulso ainda pulsa
E o corpo ainda é pouco”
O Pulso (Titãs)
SOBRE O LIVRO NO BLOG
Comentários
Postar um comentário